Fortalecendo

13 de abril de 2010

Que sua vida mudasse


Ela já não sabia mais o que esperar daquele casamento. Cada fim de tarde a mesma agonia lhe tomava conta por completo. Ficava imaginando que desculpa ele usaria desta vez, onde diria que esteve, que mentira iria contar...
Em quase 6 anos de casamento as coisas nunca estiveram assim tão confusas. Tudo parecia degringolar em uma  velocidade nunca antes vista. Todo o sentimento que nascera entre os dois naquela primavera parecia agora definhar. O encanto antes cultivado cedeu lugar à desconfiança, à descrença numa possível mudança de atitudes.
Naquela noite ele chegou já eram quase 23hs. Onde estaria, imaginou. Quando ouviu o barulho do portão abrindo começou a pensar nas noites em que passou esperando ele chegar. Não foram poucas. Tantas noites de sono perdidas, esperando alguém que poucos anos antes não cogitava afastar-se dela por mais de 10 ou 12 horas. E quando ele finalmente chegava, ao invés de sentir-se mais tranqüila, o coração parecia-lhe pesar uma tonelada, todo aquele ritual acontecia todas as vezes: contar onde estava, com quem. Brigas, discussões, palavras que iam cortando mais que lâminas. Em seguida ele dormia e ela chorava. Chorava por horas. Amanhecia em claro, com olheiras enormes, olhos vermelhos. 
No dia seguinte, como se nada tivesse acontecido ele conversava normalmente com ela, banalidades, geralmente. Lhe espantava a sua capacidade de fingir que nada tinha acontecido ali. Ou então, não lhe dirigia a palavra, como se fosse ela quem tivesse passado a noite fora e voltado completamente embriagada para casa. Passava dias inteiros com o coração esfacelado, sem vontade de sorrir, sem vontade de viver. Pensava em tantas coisas através das quais pudesse dar cabo de tudo aquilo mas infelizmente (ou felizmente?) lhe faltava coragem para qualquer atitude extremada.
Assim que ele entrou em casa naquela noite, foi logo dizendo que não tinha feito nada demais, que não tinha feito mal a ninguém. Não sabia ele que estava fazendo mal sim. A ele mesmo. A ela e ao filho também, que via o pai somente poucos minutos pela manhã. Isso lhe doía mais que a sua própria dor. Ouvir o filho perguntando do pai. Ele sentia falta de estar com seu pai. De brincar. De simplesmente tê-lo perto. Mas isso seu egocêntrico pai não percebia. Achava que estar junto durante o sono era estar presente. A primeira infância, assim como as outras fases da vida de uma pessoa, passam depressa demais e não voltam jamais. O que deixamos de viver hoje não poderá ser vivido amanhã, pois o amanhã poderá não chegar.
Ela já não aguentava mais aquilo, estava infeliz demais e sem esperança. Sem esperança de que seu amor voltasse a ser aquele por quem ela se apaixonou naquela noite em que foram para casa, caminhando juntos  numa noite agradável de primavera.
Não, ela não queria separar-se dele! Apenas queria ser feliz. Queria que fossem felizes como já haviam sido um dia. Queria que o filho crescesse numa família unida e estável, diferente daquela em que foram criados. Tudo que ela queria era que se findassem as mentiras e as meias verdades. Que findassem as noites insones e os olhos inchados, que terminasse de uma vez por todas com a agonia que vinha junto com os fins de tarde.
Que sua vida mudasse. Que suas vidas mudassem. Enquanto isso não acontecia ela ia tomando, junto com seus remédios, uma dose de coragem para poder arriscar-se no desconhecido. E o desconhecido era o instante seguinte...

Nenhum comentário: